O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Bets, apresentado nesta terça-feira (10) no Senado Federal, pediu o indiciamento de 16 pessoas e empresas ligadas ao mercado de apostas esportivas online. Entre os nomes destacados estão as influenciadoras digitais Virgínia Fonseca e Deolane Bezerra dos Santos, que juntas somam mais de 70 milhões de seguidores nas redes sociais.
O documento, elaborado pela relatora da CPI, senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), aponta que ambas teriam cometido crimes como estelionato, lavagem de dinheiro e propaganda enganosa, além de promoverem plataformas sem autorização do Ministério da Fazenda. A CPI investiga a atuação de influenciadores na divulgação de jogos do tipo “tigrinho”, que operam com algoritmos não auditáveis e possíveis manipulações de resultado.
Simulações, comissões sobre perdas e “cachê da desgraça alheia”
Segundo o relatório, Virgínia Fonseca teria utilizado contas falsas para simular prêmios em apostas online, encorajando seus seguidores a fazerem o mesmo, o que configura indução ao erro e violação do Código de Defesa do Consumidor. A senadora Soraya revelou ainda que a influenciadora firmou contrato com cláusula de comissão: ela receberia 30% do valor perdido pelos usuários que apostassem por meio de seus links — prática descrita como “cachê da desgraça alheia”.
Apesar de Virgínia ter negado tal prática, o contrato apresentado à CPI confirma o modelo de remuneração. Em um dos vídeos analisados, ela aparece incentivando os seguidores: “Está dando muito dinheiro! Uma seguidora entrou no link, botou R$ 20 e ganhou R$ 4 mil, corram é só por R$ 20 e jogar”.
Deolane e a suspeita de ocultação societária
No caso de Deolane Bezerra, a relatora afirmou que a influenciadora teve vínculo societário com uma plataforma de apostas investigada, embora seu nome não conste mais formalmente na empresa. Segundo Soraya, ela teria ocultado sua ligação por meio de laranjas e continuaria recebendo repasses sob o disfarce de contratos publicitários.
“A ocultação da verdadeira condição de Deolane na empresa, que se viu representada por possíveis ‘laranjas’, com repasses a título de propaganda, pode caracterizar, também, o delito de lavagem de dinheiro”, aponta o parecer. A CPI também destacou que a empresa promovida por ela dizia, de forma enganosa, ter autorização federal para operar.
Pronunciamento da defesa de Virgínia Fonseca
Em nota oficial assinada pelo advogado Michel Saliba, a defesa de Virgínia disse que ela recebeu com “surpresa e espanto” o pedido de indiciamento e reafirmou que a influenciadora sempre atuou de forma lícita na publicidade das plataformas. A nota declara que a defesa aguardará a deliberação colegiada da CPI antes de se manifestar formalmente, confiando no discernimento dos senadores para evitar “medidas injustas” contra Virgínia, enquanto outros influenciadores estariam sendo poupados.
“A defesa se pronunciará oportunamente, após a deliberação colegiada final da CPI, sempre confiando que se observe à Virgínia o mesmo tratamento dado a outros influenciadores digitais que, assim como ela, agiram licitamente na divulgação e publicidade das Bets, e que, no entanto, não constaram como indicados na manifestação da relatora.”
Deolane critica seletividade e se diz alvo por ser mulher
Já Deolane Bezerra se pronunciou por meio de suas redes sociais, onde prometeu se manifestar com mais detalhes após a votação do relatório no Senado, marcada para o próximo dia 17. Em um tom crítico, ela questionou o que chamou de “preconceito estrutural” contra mulheres e disse que sua luta é contra o sistema judicial utilizado para atender a interesses particulares.
“Talvez aprendi a conviver com esse preconceito estrutural, em um país em que uma mulher nunca pode nada, principalmente ‘se meter’ a fazer algo liderado por homens, que no presente caso foram isentos de uma proposta de indiciamento, não é?”
“Eu sempre trabalhei dentro dos limites da lei, sempre declarei meus impostos e fui transparente nas minhas publicidades, diferente de muitos que estão aí livres e passando batido…”, escreveu.
Deolane finalizou sua publicação afirmando: “A pessoa aqui não tem dom pra vítima!”
Próximos passos
O relatório ainda precisa ser votado pelos demais senadores da CPI. Se aprovado, será encaminhado ao Ministério Público Federal, que decidirá se oferece denúncia formal ou arquiva os pedidos. A CPI das Bets foi criada para investigar possíveis abusos e ilegalidades na promoção de apostas digitais por influenciadores, mercado que movimenta bilhões e tem avançado rapidamente no Brasil.