Organizações criminosas – internacionalização fruto de engessamento legal

A globalização mundial facilitou a interação entre as organizações de continentes diversos, com apoio e cadeia de fornecimento transnacional

Flavio Werneck
Por Flavio Werneck  - Segurança Pública 4 Min Leitura
4 Min Leitura
Enquanto o Brasil gasta milhões com prisões de baixo risco, criminosos mais perigosos seguem impunes, revelando as falhas de um sistema penal ineficazImagem: Antonio Cruz/Agência Brasil
ouça o post

Nos últimos 16 anos observamos que as organizações criminosas brasileiras fizeram o que podemos denominar de “planejamento estratégico”:

1)Investiram na dominação de todo a linha econômica do tráfico internacional de drogas (des de a plantação até a internacionalização);
2)Ampliaram os meios de ocultação do dinheiro ilícito, via pedras preciosas, ouro, moedas digitais, bets, postos de combustíveis, igrejas e outros;
3) Dominaram outros “nichos” de cometimento de crimes, como extração ilegal de ouro, madeira, falsificação de cigarros, comercialização de conteúdo de TV fechada e gás, aluguel de armamento pesado para assalto a instituições financeiras e transporte de valores, dentre outros;
4) Permeabilidade nos poderes constituídos, inicialmente cooptando integrantes das forças de segurança, Ministério Público e Justiça agora ampliando investimento na eleição de políticos para os mais variados cargos políticos e indicações para postos chaves da administração pública e participação em licitações e tomadas de preço públicos.

Bancada das organizações criminosas

O que está claro é que temos hoje uma “bancada” das organizações criminosas, que contam com estratégia de investimentos e análise de riscos para implementação das ações de seus criminosos. E a globalização mundial ainda facilitou a interação entre as organizações de continentes diversos, com apoio, cadeia de fornecimento transnacional, num verdadeiro mercado “ilegal global interligado”.

E o que estamos fazendo para evitar esse crescimento no Brasil nesses últimos 16 anos?
A resposta é simples e direta: muito pouco ou nada. Triste, mas é o reflexo do congelamento das propostas de melhoria na eficiência no Congresso Nacional, que se omite em buscar o que há de mais eficaz mundo afora, mantendo a estrutura velha e carcomida do processo penal brasileiro, fazendo pequenos remendos quando pressionados e empurrando os governadores para o discurso de sempre: mais polícia, mais viatura e mais armas! Discurso também velho (mais de 90 anos nele) e que não mostra nem eficiência e muito menos resultado positivo.

Mais o que pode ser feito?

Sendo bem pragmático: a eficiência no combate ao crime organizado hoje passa pela celeridade das investigações e a concretude das provas colhidas para condenação. Para isso se faz necessário que tais investigações sejam feitas diretamente sobre a tutela do judiciário, evitando-se a repetição de atos e fabricação de papéis (digitais ou físicos) desnecessários e inócuos; a absorção de ferramentas tecnológicas e de mapeamento dos padrões de ação das organizações; a coerção firme e rápida, com o bloqueio de bens e ativos e inversão do ônus da prova destes como produtos de crime; aprimorar o resultado do tão falado “siga o dinheiro _ follow the Money” – evitando/proibindo benefícios legais para funcionários corruptos e os branqueadores de capital; RESUMINDO: aumentar os custos e riscos associados ao crime organizado.

Por fim uma reflexão: vocês já pararam para pensar que o Brasil gasta milhões no combate ao tráfico internacional, mobilizando policiais, judiciário, defensoria, MP e sistema carcerário sendo que os países de destino não ficam com esse preso e essa droga (que gera um problema de saúde pública) sequer ficaria no país? E que nosso sistema hoje existente mantém presos esses “mulas” e não os assassinos e estupradores, que muita vezes respondem em liberdade e até se candidatam e são eleitos em cargos públicos? O que é mais importante? A vida ou a permanência de sistema de prisioneiros do pequeno tráfico internacional que deveriam cumprir pena lá, e não aqui?

Compartilhe esse Artigo
Posted by Flavio Werneck Segurança Pública
seguir
Advogado, servidor público, mestre em criminologia e pós-graduado pela Escola do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.
Deixe sua opnião
Verified by MonsterInsights