“Em nenhum momento, vejo o pior para meu filho. Pelo estado dele, vejo que estamos no caminho da cura”. A esperança de Paulo Nascimento, 47 anos, para o filho de 3, Lincoln Miguel, representa o sentimento de muitas famílias que enfrentam o diagnóstico da principal causa de morte por doença entre crianças e adolescentes: o câncer infantil. Na luta contra a doença, o diagnóstico precoce é fundamental para o tratamento.
Para isso, é preciso um trabalho conjunto de pais e profissionais de saúde. “Não existe nenhum exame preventivo para câncer infantil; a nossa maior arma é o diagnóstico precoce. O pediatra deve encaminhar rapidamente para o centro de referência da sua região, para que seja feito um diagnóstico preciso”, ressalta a pediatra oncologista e hematologista Isis Magalhães, do Hospital da Criança de Brasília (HCB). É para a unidade que são encaminhados casos suspeitos e para tratamento na rede pública do DF.
Em acompanhamento no HCB há um ano, Lincoln iniciou o tratamento devido a complicações que surgiram da prematuridade. A equipe desconfiou de alguns resultados nos exames de rotina da criança e, após outros testes, veio o diagnóstico de câncer de fígado e pulmão. Apesar da apreensão, o pai, Paulo, segue confiante: “Meu filho é superbem-atendido, porque aqui é o centro de referência”.
Sintomas
Há uma dificuldade no diagnóstico precoce, pois a maioria dos sintomas dos tipos de câncer mais comuns em crianças e adolescentes são confundidos com os de outras doenças. A especialista alerta que, se sintomas ou dores forem relatados repetidamente, é necessário dar atenção ao problema. “Não é manha. Vários sintomas se confundem com uma virose, mas o tempo de uma virose em uma criança, normalmente, é de cinco dias, no máximo. Qualquer coisa que ultrapasse o habitual, os pais têm de se atentar e o pediatra precisa avaliar”, orienta.
Os tipos de câncer mais frequentes nas crianças são as leucemias e os linfomas. Em seguida, estão os tumores no sistema nervoso central e no sistema nervoso simpático, rabdomiossarcomas (tipo raro de câncer que afeta as células do tecido muscular) e outros sarcomas (grupo de tumores raros que geralmente atinge os ossos e partes moles), tumores renais, tumores ósseos e o retinoblastoma (tipo raro de câncer ocular).
A identificação precoce do tipo de câncer também é importante para evitar sequelas mais graves, como no caso do retinoblastoma. Se tratado no início, há mais chance de preservar a visão. “É preciso observar os sinais de alerta do retinoblastoma, como o reflexo branco nos olhos, porque o normal é o reflexo vermelho. Assim que os pais observarem esse sinal, devem levar o filho ao médico”, explica a oftalmologista do Hospital Regional da Asa Norte (Hran) Manuella Neves.
Atendimento
Na rede de saúde do DF, uma vez que os pais identifiquem sinais, a recomendação é procurar ajuda médica. A porta de entrada é sempre a unidade básica de saúde (UBS), mas as unidades de pronto atendimento (UPAs) e hospitais regionais também podem encaminhar o paciente para o HCB.
O médico da unidade solicitante emite o pedido por meio de formulário próprio e insere o usuário no sistema. A Central de Regulação, de acordo com o critério de prioridades e o número de vagas disponíveis, fará o agendamento da consulta.
De acordo com dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), a estimativa de novos casos de câncer infantojuvenil no Brasil para o triênio de 2023 a 2025 é de 7.930, sendo 4.230 em meninos e 3.700 em meninas. No DF, são mais de 200 novos casos de câncer em crianças e adolescentes atendidos por ano no HCB. Além disso, o hospital soma 1.200 consultas em diversas especialidades e 300 internações hospitalares por mês.
Tratamento
O câncer na criança possui uma biologia diferente do adulto. Nos casos infantojuvenis, a doença é sistêmica e composta predominantemente de células embrionárias, com uma divisão celular mais rápida. A característica, apesar de aumentar a gravidade, auxilia no tratamento. “É um paradoxo. É um câncer grave e de aparecimento rápido, mas responde melhor à quimioterapia”, pontua a oncologista Isis Magalhães.
Geralmente, os tratamentos duram, em média, 24 meses, a depender do tipo de câncer, mas o acompanhamento dura cinco anos, sendo necessário, especialmente devido a complicações que podem surgir da quimioterapia. “Ela destrói as células cancerígenas e as normais, como cabelo, mucosa e o sistema de glóbulos brancos. A criança fica com imunidade baixa, pela própria doença e pelo tratamento. É essencial ter suporte, com uma estrutura hospitalar adequada”, detalha a especialista.
Enzo Gabriel Sousa, 4, está em tratamento de leucemia há cerca de dois anos no HCB. Vindos de Palmas (TO), ele e a mãe, Maria Elisângela Sousa, 43, receberam apoio da organização não governamental (ONG) Abrace, que custeou transporte e hospedagem.
“Quando ele iniciou o tratamento, tinha 3 anos incompletos e estava bastante debilitado; hoje, já está bem melhor. Vamos voltar para casa e retornar para consulta em 19 de dezembro. Aqui ele faz todos os procedimentos e exames necessários”, conta a mãe.
Dia Nacional de Combate ao Câncer Infantil
Esta quinta-feira (23) é o Dia Nacional de Combate ao Câncer Infantil. Instituída pela lei nº 11.650/2008, a data tem o objetivo de estimular ações educativas e preventivas sobre o câncer infantil, promover debates e outros eventos sobre políticas públicas, apoiar as atividades desenvolvidas pela sociedade civil em prol das crianças com câncer e difundir os avanços técnico-científicos.