O presidente Luiz Inácio Lula da Silva instituiu hoje (18) um grupo de trabalho para a elaboração de uma proposta que trata da Política de Valorização do Salário Mínimo, que trará uma fórmula de cálculo permanente para o piso nacional. Em encontro com cerca de 500 sindicalistas no Palácio do Planalto, Lula disse que o salário mínimo precisa subir de acordo com o crescimento da economia, em equivalência ao aumento do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país).
Já provamos que é possível aumentar o salário mínimo acima da inflação. E o mínimo é a melhor forma de fazermos distribuição de renda nesse país. Não adianta o PIB crescer se ele não for distribuído. O PIB já cresceu 14% ao ano nesse país e o trabalhador ficou mais pobre. Porque se o PIB cresce e fica só com o dono da empresa, quem fez o PIB crescer não ganha nada, que é o trabalhador brasileiro”, disse o presidente.
“É isso que tem que fazer para melhorar esse país. Não podemos continuar eternamente um país emergente, em via de desenvolvimento”, acrescentou.
O grupo foi criado a partir de um despacho assinado nesta quarta-feira pelo presidente e terá prazo de 90 dias para a conclusão dos trabalhos. Fazem parte os ministérios do Trabalho e Emprego, da Fazenda, do Planejamento e Orçamento, da Previdência Social, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, e a Secretaria-Geral e Casa Civil da Presidência. Segundo Lula, as centrais sindicais também serão ouvidas para a construção da proposta.
“Estou fazendo um convite para que o movimento sindical, representando os trabalhadores brasileiros, ajude o governo a construir uma nova relação entre capital e trabalho e uma nova relação de direitos para o povo trabalhador, porque nós merecemos ser tratados com respeito e com justiça”, disse Lula.
“O mundo do trabalho mudou, é preciso se modernizar, se reinventar a nível de estrutura sindical, por isso que vamos criar uma comissão de negociação com sindicatos, governo e empresários”, destacou o presidente.
Já o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, salientou que a nova política para o salário mínimo será feita pelo conjunto de governo, e respeitando a previsibilidade da economia.
A previsibilidade é importante para o empresariado, para os prefeitos, para os governadores, para o governo federal, para as instituições da economia, para que nós possamos fazer o que nós fizemos no primeiro governo do presidente Lula que é crescer o poder de compra do salário mínimo mantendo a inflação, mantendo o equilíbrio fiscal. Não tem canetaço, tem construção de entendimento”, disse.
De acordo com o ministro, também serão criados, até o final de fevereiro, dois outros grupos de trabalho, sobre a negociação coletiva e o fortalecimento dos sindicatos e sobre a regulamentação do trabalho por aplicativos.
“Nós acompanhamos a angústia de trabalhadores de aplicativos que, muitas vezes, têm que trabalhar 14 horas, 16 horas por dia para poder levar o pão e leite para casa. Isso no meu conceito de trabalho, beira a trabalho escravo. Aqui, as empresas de aplicativos, de plataformas, não se assuntem. Não há aqui nada de mais a não ser o propósito de valorizar o trabalho e trazer a proteção social”, disse Marinho.
Negociações
As centrais sindicais defendem que o governo federal aplique a política de valorização conforme os termos pactuados em 2007 e abandonados em 2019. Com isso, o piso deveria ser de R$ 1.343, contemplando a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) – anteriormente estimado em 5,8% em 2022 -, mais o crescimento do Produto Interno Bruto de 2 anos antes – 4,6% em 2020.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), o INPC acumulado oficialmente em 2022 é de 5,93%.
Para o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, a previsibilidade e a valorização permanente do salário são elementos centrais para reconstrução e transformação do Brasil.
“Àqueles que tentam impor em debate responsabilidade fiscal contra responsabilidade social, a responsabilidade fiscal não pode ser o custo do maltrato ao povo pobre, ao povo que padece de insegurança alimentar. O custo fiscal precisa ser um esforço combinado de um Brasil atrasado, mas que tem uma dívida e precisa construir um pacto com seu povo, que pressupõe a constituição de uma política que recompõe não só a inflação, mas sobretudo permitir o ganho real com aumento da variação do PIB”, disse.
“Isso importa muito para a vida de 60 milhões de brasileiros e incrementa e movimenta a economia”, argumentou Araújo. “Temos que fazer o bom combate. O debate do salário mínimo não pode ser pautado pelo Deus mercado [mercado financeiro]. Quem depende do salário mínimo é quem já não consegue mais fazer o supermercado. Temos que apostar em uma política que se aproxime mais dos anseios do nosso povo”, completou.
Atualmente, o salário mínimo está em R$ 1.302, conforme medida provisória editada em meados de dezembro pelo governo anterior. Esse valor considera a variação do INPC acrescido de ganho real de aproximadamente 1,4%.
Entretanto, o valor aprovado pelo Congresso Nacional no Orçamento Geral da União de 2023 é de R$ 1.320, mas, para entrar em vigor, depende de uma nova medida provisória do Executivo. A preocupação do governo é com a insuficiência de recursos para bancar o novo valor.
Apesar de a Emenda Constitucional da Transição ter assegurado R$ 6,8 bilhões para o salário mínimo de R$ 1.320, a forte liberação de aposentadorias e pensões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) nos últimos meses do ano passado pode resultar em um impacto fiscal maior que o previsto. Vários benefícios sociais e trabalhistas, como o seguro-desemprego, abono do PIS/Pasep, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e outros, também são atrelados ao piso nacional, devendo ser corrigidos.
De acordo com cálculos preliminares da equipe econômica, o governo precisaria de mais R$ 7,7 bilhões para reajustar o valor ainda em janeiro. Neste caso, os recursos poderiam vir do remanejamento de dinheiro de outros os ministérios.
Em declaração recente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que não ocorreu descumprimento de promessa de campanha do presidente Lula. “O compromisso do presidente Lula é de aumento real [para o salário mínimo], o que já aconteceu. O salário mínimo atual é 1,4% maior que a inflação acumulada desde o último reajuste”, disse.
Segundo o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em dezembro de 2022 o salário mínimo necessário para satisfazer as necessidades básicas (alimentação, moradia, vestuário, educação, higiene, transporte, lazer e previdência) de uma família com quatro pessoas deveria ser de R$ 6.647,63.
Outras pautas
Durante o evento com o presidente Lula, os sindicalistas apresentaram ainda outras demandas trabalhistas, como a regulação do trabalho em aplicativos, a valorização da negociação coletiva, o fortalecimento do Ministério do Trabalho, o reajuste da tabela do Imposto de Renda, a revogação de normas para a recuperação de direitos trabalhistas, a criação de um plano nacional de formação profissional, a melhoria e equilíbrio das condições de trabalho de mulheres e negros e o cancelamento das privatizações.
Além de Araújo, da CTB, estiveram presentes e falaram durante o evento o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sérgio Nobre; o presidente da Força Sindical, Miguel Torres; o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah; o presidente da Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), Moacyr Roberto Tesch Auersvald; o presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Antonio Neto; a presidenta da Intersindical Central Sindical, Nilza Pereira; o vice-presidente da Central Pública, Hugo René; o presidente da Intersindical Instrumento de Lutas, Emanuel Melato; e o presidente da CSP-Conlutas, Luiz Carlos Prates.
Em abril do ano passado, o movimento sindical também entregou a Lula, ainda como pré-candidato à Presidência, a Pauta da Classe Trabalhadora, documento unitário das centrais, aprovado na Conferência da Classe Trabalhadora (Conclat).